quinta-feira, outubro 27, 2005

Um comentário pertinente... Platão!!!

teresa said...
(...)parece-me que os Homens ignoram a força de Eros; se conhecessem construir-lhe-iam templos grandiosos e altares, far-lhe-iam sacrifícios sumptuosos; para já nada de tal em sua honra, quando isso é que seria preciso. Ele é, de todos os deuses, o mais filantropo, o protector dos humanos e médico de males que, se fossem curados, resultaria daí a mais perfeita felicidade para a raça dos homens. Tentarei, portanto, expor-vos a sua força e em seguida ensina-la-eis aos outros. Mas devo, em primeiro lugar, falar-vos da natureza humana e das suas paixões. Com efeito, a nossa natureza original não era o que é hoje, longe disso. A princípio havia três géneros entre os Homens e não dois como hoje, o masculino e o feminino; um terceiro era composto dos outros dois: o seu nome subsistiu, mas a coisa desapareceu: então, o real andrógino, espécie e nome, reunia num único ser o príncipio macho e fêmea; agora já não é assim e só o nome ficou como uma injúria. (...)(...) Como disse, tinham uma forma esférica e deslocavam-se circularmente, de acordo com a sua origem; daí derivam também a sua força terrível e o seu vigor. Tendo então concebido soberbos pensamentos , empreenderam (...) subir até ao céu para atacar os divinos. Então, Zeus e os outros deuses deliberaram sobre o castigo a inflingir-lhes. (...) Depois de uma penosa decisão, Júpiter dá finalmente a sua opinião: "Creio que há um meio para que continue a haver homens e para que, tornados menos fortes, estes fiquem libertos do seu desrespeito; vou cortar cada um deles em dois, ficarão mais fracos e, ao mesmo tempo, aumentando o seu número, ser-nos-ão mais úteis, dois membros bastar-lhes-ão para caminhar; e, se reincidirem na imprudência, cortá-los-ei de novo em dois, de modo que terão de andar de pé-coxinho." (...)Uma vez realizada esta divisão da natureza primitiva, eis que cada metade, desejando a outra a procurava; e os pares, estendendo os braços, agarrando-se no desejo de se reunirem, morriam de fome e também de perguiça, porquanto não queriam fazer nada no seu estado de separação. Quando uma metade perecia, a segunda, abandonada, procurava outra a quem se agarrar, quer fosse uma metade mulher completa, quer a metade de uma homem, e a raça extinguia-se assim. Compadecido, Zeus imagina então um meio: desloca os seus sexos para frante - até aí tinha-os atrás, procriando-se e reproduzindo-se não uns graças a outros, mas na terra, como fazem as cigarras. (...) De facto, é desde então que o amor mútuo é inato aos homens, que recompõe a sua natureza primitiva, procura restituir a um a partir do dois e curar essa natureza humana ferida. Cada um de nós é, portanto, como um sinal de reconhecimento, a metade de uma peça, visto que nos cortaram, como solhas, em duas partes; e cada uma vai procurando a outra metade da sua peça (...)Assim, quando os amantes (...) descobriram precisamente a metade que é a sua, é admirável como são emplogados pela ternura, o sentimento de parentesco e o amor; já não consentem em dividir-se um do outro, por assim dizer, um momento que seja. E estes são os que ficam juntos até ao fim da vida e que nem sequer conseguiriam definir o que esperam um do outro! É inverosímil que o prazer físico explique o seu vivo desejo de estarem juntos: é evidente que as suas almas desejam outra coisa, mas não podem dizer, mas que pressentem e insinuam. (...) " O vosso desejo não é assimilar-vos um ao outro tanto quanto possível e não vos deixardes nem de noite nem de dia? Se é isso que quereis, também eu quero fundir-vos, ligar-vos um ao outro e dos dois que sois fazer um só: assim, enquanto viverdes, será como um único ser, com uma vida comum, e quando morrerdes, mesmo no Hades não sereis dois mortos, mas uma única sombra. Reflecti se é esse o vosso amor e se este futuro vos satisfaz..."(...)
Platão, in Banquete